segunda-feira, 8 de novembro de 2010

Casa da estrada - pt. 1

Sai um pouco da estrada, o sinal no celular do WiFi estava mais forte, isso significa que estou chegando perto. Tem alguns morros por aqui, geralmente as casas ficam na base deles ou no alto, espero que esta esteja no alto. Fui buscando, vi algumas casas mas nenhuma com "aparência" de casa com sinal de internet WiFi, a chuva está chegando, começou a cair algumas gotas finas no pára-brisa, não vejo nenhum zumbi andando, isso é um ótimo sinal.
Encontrei a casa, o sinal aqui é muito mais forte. A estradinha de terra começando a virar lama, acredito que fiz uma grande burrada vindo pra cá, a chuva está engrossando e a Belina não está andando como deveria, estou atolando, agora que estou aqui, melhor entrar na casa.
Não sei o que vou encontrar, com o carro parado na lama a pouco mais de 3 metros da porta de entrada, desligo o farol mas mantenho o motor ligado, ainda tem luz natural mas a nuvem que se aproxima vai deixar tudo escuro.
Me cnho de coragem, carrego minha arma e saio do carro. Nada se mechendo além de mim, o vento está ficando mais e mais forte, a chuva agora já cai pesado. Vejo para os lados, algumas outras casas sem luz, a estrada alí atrás nenhum movimento e a casa na minha frente completamente silenciosa. Até onde posso ouvir com o barulho de água caindo nessas telhas velhas e na lataria do carro. Essa chuva realmente está com cara de que vai durar um bom tempo e realmente dirigir com ela não seria uma boa.
Armo a arma, destravo e sigo em direção à porta.
Incrível como pode escurecer rápido aqui. Ainda são 5 da tarde mas essa nuvem de chuva realmente está grande. Toda a terra em volta do terreno já virou lama, minha bota está atolando e meus passos estão muito pesados.
Essa casa de madeira provavelmente não aguentaria uma manada, mas como não vi nenhum zumbi até agora, não preciso me preocupar já com isso.
Apenas uma janela na frente, uma atrás e uma do lado. Uma janela pequena, suficiente para entrar ou sair uma pessoa mas ela é alta, isso é ótimo, terei uma visão mais ampla do terreno mas infelizmente atrás é um matagal fechado. Essa antena parabólica do lado significa que mesmo sendo simples, essa casa pode receber vários tipos de sinais, talvez, com sorte, consiga informações em algum canal, algum sinal de vida fora daqui.
Essa sensação de isolamento tem mechido comigo, me sinto só, com medo, preocupado com meu filho e a cena dos funcionários daquele mercado em Brasília morrendo ainda me assombra na memória.
O vento está vindo mais frio, isso significa que estou mesmo bem mais próximo do sul, minha respiração começa a sair em forma de vapor, meu óculos está cheio de gotas na lente... melhor entrar.
A casa está escura, a porta não estava trancada, isso é um péssimo sinal. Acendo minha lanterna e não vejo nada. Andando devagar, sabendo que a sola dura da bota junto com a lama faz um som estranho, acho que meus barulhos estão sendo abafados com o barulho da chuva na telha. Encontrei um interruptor, não vejo nada de errado.
Ao acender, vejo no meu lado esquerdo um sofá velho meio marrom com um corpo muito magro. Aquele corpo deve estar ai a um bom tempo, incrivelmente não fede. Já deve estar meio mumificado, sua pele cinza e esticada mostra seu estado de podridão avançado. A casa é pequena então posso verificar melhor a residência.
Fui para a cozinha, o assoalho de madeira range bastante, as paredes de madeira com uma pintura bege descascada mostra a infiltração. Não vejo quadros ou fotos na parede, a cozinha está empoeirada e o armário de madeira acima da pia está entre aberto. Há um botijão de gás e ao virar o botão simples de quatro bocas vejo que ainda tem gás. Tem apenas 1 quarto, ele é grande, uma cama de casal desarrumada, sem sinal de sangue. A janela do quarto que dá pro matagal está aberta e pelo visto, está aberta a um bom tempo. A mistura de poeira e água da chuva fez uma lama cinza que escorre pela beirada da janela e formou uma poça logo abaixo. Encontrei o computador, estava ao aldo do armário do quarto, um armário estilo antigo, madeira maciça, de cor escura e muito alto. Tem 6 portas e pega quase a parede inteira e quase alcança o teto. Sim, é um computador simples e com internet, o cabo que sai da parede vem de fora, possivelmente é daqueles via satélite para zonas rurais.
Dou uma olhada pela janela, só vejo mato e a copa das árvores dançando conforme o vento forte da chuva. O barulho é muito alto, a casa não tem forro e há pequenas goteiras pela casa.
Tenho que me livrar desse corpo no sofá, não quero nada disso perto de mim. Ao chegar perto, cutuquei com a arma sua cabeça e nada de reação. Cutuquei, chutei, balancei o sofá e nada, aquilo era realmente um morto MORTO.
Pelo visto era uma moça, esta com um vestido simples de tom amarelado desbotado, o cabelo castanho escuro estava bem emaranhado e naõ tinha sapato. Não sei o nome, não sei como ela era. Estranhamente essa casa não tem fotos. Os móveis rústicos da sala estão vazios, tem uma televisão velha de 14 polegadas de frente ao sofá. Não tem marca de nada além disso. Apenas poeira. Essa casa não tem movimento há dias, possivelmente semanas.
Vou jogar esse corpo lá fora, Seus braços magros de pele rígida não se mechem, vou ter que carregar pegando no tronco mesmo... detestei a idéia.
Ao sentar o corpo, saiu um gemido muito baixo da boca dela mas não mecheu a cabeça nem se movimentou, apenas gemia como um deles. Deu para ver que tentava abrir a boca mas estava muito rígida. É claro que só analisei isso depois de me recompor ao cair para trás com o susto deixando sair um gritinho que eu não gostaria de descrever agora.
Aquilo estava lá, sentado, por minha culpa, gemendo e tentando mecher a boca. Sua cabeça fazia um esforço descomunal para se virar para mim e apenas um de seus olhos estavam abrindo. Alguns dedos começaram a se mecher estalando, som de ossos estalando estavam cada vez mais frequente saindo daquele corpo. Eu ainda estava no chão, olhando aquela monstruosidade se esforçando para se mecher e me comer mas fiquei pasmo, não se era medo ou simplesmente estava fascinado com aquilo tudo, só sei que não pensei direito e quando dei por mim ela já estava tentando se levantar, com dificuldade mas conseguiu seus movimentos de volta. Na queda minha arma caiu, não sei para onde mas estou desarmado. Melhor dar um chute nisso, estou com botas militares, isso tem que servir.
Ao me levanar sua cabeça me acompanhou, sempre mirada em mim, erguento com dificuldade o braço, gemendo e com aquela expressão "preciso me alimentar de você". O "freio moral" que todos nós temos antes de chutar a cabeça de uma moça, foi-se.
O chute pegou na testa e isso derrubou-a no sofá. O som de osso quebrando foi agoniante, não foi nada legal. Tive um impulso idiota de perguntar a ela se estava tudo bem mas lembrei que ela não estava bem fazia pelo menos umas 2 semanas.
Ela se curvou para frente de novo, e dei outro chute, mas esse foi lateral, queria que ela caisse no chão. O nervoso e a tensão fez com que minha perna doesse um pouco, os meus músculos não estão preparados para esse tipo de combate o tempo todo. Antes de me lamentar o quanto estou fora de forma, melhor eliminar logo essa desgraça. Comecei a pisar na cabeça, com força, pisei várias vezes até que o som de crânio quebrando saiu dalí do chão. Pise mais e mais, um momento de insanidade correu meu corpo e não quis parar até me dar conta que não havia mais nada alí onde era a cabeça, apenas um amontoado de cabelo com uma gosma escura que se completava com um tronco e um corpo cinza com um vestido amarelo desbotado.
Agora que me livrei desse impecílio, tenho que tentar achar minha arma, jogar esse corpo fora e pensar melhor, me recompor por completo. Minhas mãos estão tremendo, sinto um frio na barriga de nervoso, parece que cometi um crime, me sinto culpado, me sinto um monstro em ter esfarelado a cabeça de uma moça pisando em cima sem parar.
Antes de abrir a porta dou uma olhada nas frestas entre as tábuas que fazem a janela da sala da entrada, não tem nada lá, somente chuva, vento, a Belina e lama. O pouco de luz natural que ainda tem lá fora já está sumindo como filetes de luz azul no horizonte, não sei que horas são agora mas é noite e é hora deles ficarem mais ativos.
Abri a porta com uma certa dificuldade, a madeira molhada está raspando no chão, pelo visto isso não é de agora, tem a marca de madeira raspada formando um semi círculo no chão onde a porta raspou, isso fez um barulho medonho mas ainda bem que essa chuva é mais barulhenta. Joguei o corpo lá fora na lama, não quero essa coisa por aqui, ainda tive que arrastar pelas pernas e empurrar aos chutes.
Sei que tem uma pequena casa ao lado dessa, a pintura está mais acabada e espero que não tenha nada lá. Um zumbi por dia para mim é o suficiente. Vou fechar a porta do quarto, a janela está aberta e não quero correr riscos, achei minha arma no chão perto da porta, ela escorregou bastante até aqui, pelo visto meu susto foi bem maior. Pensando bem, tive muita sorte desse zumbi ser um daqueles bem detonados, já estava bem debilitado e não conseguia se mover direito. Se fosse um daqueles inteiros, eu estaria em pedaços agora.
Vou dar uma olhada na cozinha, está bem escuro lá fora, não dá para ver nada. Bisbilhotando a cozinha simples, percebi que só tem esse armário de duas portas acima da pia, não tem mais nada além do fogão. Não tem geladeira, talvez essa esteja na casa ao lado. Se ainda tem luz, deve ter alguma coisa nela. Ao abrir a pia saiu uma água barrenta, já estava xingando tudo quando começou sair limpa, muito tempo parado a sujeira do cano acumulou mas agora está limpa, no armário pequeno tem uma caixa de metal com café, essa foi a coisa mais linda que eu vi nos últimos dias. Coloquei água para ferver e comecei a preparar o café.
Ao procurar o filtro, não achei nada. Nem filtro de papel nem filtro de pano, nada. A água fervia, o vapor da água quente condensava na parede atrás do fogão e o pó ali, cheirando bem.
-Filho da puta!!!
Comecei a rir quase que histéricamente, consigo xingar um café mas tive pena de um zumbi...